"Toda viagem deveria oferecer oportunidades para uma maior compreensão de si - e, na verdade, muitos livros de viagens são autobiografias disfarçadas: livros sobre o viajante, e não sobre o lugar" (Paul Theroux)
sexta-feira, 20 de agosto de 2010
Minha vida é comer por este país prá ver se um dia descanso feliz...
Foi a quinta vez que estive em Campo Grande. Fui em 2007 por ocasião do Encontro Regional de Fiscalização de Agrotóxicos, depois em visita à Embrapa Gado de Corte com o prof. Evaldo e em uma reunião do Labex sobre Saúde Animal. E agora, conforme comentei no post anterior, fui iniciar os preparativos para a etapa nacional do Enfisa 2011.
Eu já tinha lido e ouvido falar sobre o fato do sobá fazer parte do patrimônio imaterial da cidade, mas nunca tinha comido. Existem dezenas de sobarias na cidade. Eu deveria ter tirado uma foto das páginas amarelas, em que a parte de restaurantes é dominada por anúncios de delivery de sobá. Experimentei e achei delicioso, bem caseiro, com gostinho de saudade do meu ditian. Ele era diabético e o único macarrão que ele comia era o sobá e eu adorava estar por perto para comer sobá com shoyu.
Provavelmente, irei a Campo Grande mais quatro ou cinco vezes até junho de 2011, o que significa muito sobá a vista!
SOBÁ: PATRIMÔNIO IMATERIAL DE CAMPO GRANDE/MS
O sobá é um prato típico da gastronomia campo-grandense, adaptado da culinária oriental pelos imigrantes vindos, em 1908, da província de Okinawa, arquipélago de influência chinesa, na região sul do Japão. Nessa cidade, tradicionalmente, à véspera do ano novo, as famílias se reuniam para degustar esse tradicional prato feito de macarrão de trigo sarraceno, o toshikoshi-soba.
Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, é a terceira cidade do Brasil com maior número de descendentes japoneses. Estes se fixaram na região rural do município, à época, sul de Mato Grosso, onde passaram a praticar a agricultura e a negociar seus produtos nas feiras.
O sobá, que é uma adaptação dos produtos locais à culinária oriental (resultado do diálogo da cultura milenar com as matérias primas do meio ambiente regional), era consumido, a princípio, apenas pelos imigrantes e fora dos olhares da clientela Gaijin, isto é, dos não-orientais. Todavia o costume se difunde, e a população apropria-se da iguaria, consumindo-a cotidianamente. Tornou-se, assim, um prato típico de Campo Grande, amplamente divulgado nos restaurantes e nas dezenas de sobarias. É a principal atração da Feira Central da cidade que anualmente promove o Festival do Sobá em parceria com a Prefeitura Municipal.
Entretanto o sobá campo-grandense tem seu diferencial que não é encontrado no original e nem nos demais núcleos de imigrantes do país, sendo uma especificidade da cultura local.
Numa panela, cozinha-se o osso de porco com água. Coa-se o caldo que é temperado com shoyu, saquê, gengibre e sal. Serve-se numa tigela chinesa ou cumbuca, enriquecido com macarrão, carne (porco, gado ou frango), cebolinha e omelete picados.
Campo Grande/MS é a segunda cidade no país a ter uma legislação específica para o registro dos bens culturais de natureza imaterial por meio do decreto municipal n° 9.685, de 18 de julho de 2006. O sobá foi registrado como o primeiro bem imaterial de seu Patrimônio Histórico e Cultural, o que atesta a importância da imigração japonesa na cena cultural regional.
A legislação para registro e salvaguarda dos bens culturais intangíveis é recente, porém com raízes que remontam às discussões acerca da preservação das manifestações culturais tradicionais iniciadas no século XIX que anunciaram a morte do folclore. A cultura tradicional, todavia, tomou proveito da tecnologia e da mídia burguesa, tornando-as grandes parceiras na difusão e divulgação desse patrimônio cultural ao grande público.
Rubens Costa Marques
Publicado no Recanto das Letras em 22/07/2009
Código do texto: T1714018
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Sussumu Sato
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